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quinta-feira, 19 de junho de 2025

Como o pastor evangélico ajudou no motim da Casa de Custódia Moniz Sodré

01/06/2004 08h10 – Atualizado em 01/06/2004 08h10

Durou 62 horas a rebelião na Casa de Custódia de Benfica — a segunda maior já ocorrida no Rio. Por volta das 20h30m de ontem, os detentos entregaram as armas e libertaram os últimos reféns. Com os amotinados foram apreendidos duas pistolas, duas escopetas e quatro revólveres, tomados dos vigias da casa de custódia.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alerj disse que entrou na cadeia e contou 28 corpos de presos, alguns mutilados e outros queimados. Pelo menos um corpo foi degolado. Bombeiros que saíram da cadeia no início da madrugada afirmaram ter visto entre 40 e 50 corpos de presos.
O secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos, no entanto, disse no início da noite que o número de mortos era desconhecido. Ele informou que 14 detentos ficaram feridos.
Depois de convidadas a participar de uma revista nas celas após o fim da rebelião, entidades defensoras dos direitos humanos receberam uma contra-ordem. O comando da PM, que assumira de manhã a chefia das negociações com os amotinados, vetou o acesso de representantes da Defensoria Pública, da Pastoral Penal e de outras entidades à cadeia, , onde há mais de 800 presos. Impedido de acompanhar a revista, o defensor público Leonardo Rosa Melo da Cunha ficou revoltado. A Defensoria Pública vai processar o estado.
Também impedido de entrar, o coordenador do Conselho da Comunidade Carcerária, Marcelo Freixo, disse que a atitude do governo compromete a transparência da ação das autoridades.
— Já tínhamos alertado para a possibilidade de um massacre, por causa da mistura de presos de facções diferentes — disse Freixo.
Pastor é aclamado ao chegar à prisão
Os reféns foram libertados aos poucos, ao longo do dia. Sete pessoas foram soltas depois que o pastor evangélico Marcos Pereira da Silva passou, a pedido dos presos, a conduzir as negociações com os amotinados. Faltava, àquela altura, libertar 14. Um dos reféns, o agente penitenciário Marco Antonio Borgatte, de 44 anos, foi morto na tarde de domingo.
Aclamado pela multidão de parentes de presos, o pastor chegou à unidade por volta das 16h. Marcos, que estava acompanhado do comandante de Policiamento da Baixada, coronel Francisco D’Ambrósio, disse que só aceitou a missão por ter sido chamado pelo secretário de Segurança, Anthony Garotinho.
A presença do pastor foi reivindicada pelos detentos desde as primeiras horas da manhã. Antes mesmo de serem retomadas as negociações, os rebelados já gritavam que queriam a presença dele. Depois da execução do refém, as negociações foram assumidas por três policiais do Bope, além do subsecretário Operacional de Segurança Pública, Paulo Souto, e de Marcelo Freixo.
Durante todo o dia, presos fizeram questão de exibir armas e cartazes por buracos nas paredes do prédio. Enquanto na praça em frente mulheres de presos faziam uma corrente de oração, no pátio da casa de custódia reféns eram amarrados a cilindros de gás. A cena podia ser vista do alto da Escola Municipal Cardeal Leme, que fica em frente à cadeia e não teve aulas ontem.
Cerca de 500 pessoas acompanharam, no Cemitério de Irajá, o sepultamento do agente assassinado.
Bíblia para uma Facção
O pastor evangélico Marcos Pereira da Silva, da Assembléia de Deus dos Últimos Dias, de Éden (São João de Meriti), trabalha na evangelização de detentos em presídios do Rio. Em dezembro de 2001, ele ajudou a acabar com uma rebelião na Casa de Custódia Moniz Sodré, em Bangu. Em abril de 2002, o pastor atuou num motim na Casa de Custódia Jorge Santana, no Complexo de Bangu. No mesmo ano, foi chamado para resolver uma rebelião na Casa de Custódia Bangu V. Agentes penitenciários contam que, estranhamente, o pastor presta mais apoio para uma determinada facção criminosa.
Em setembro de 2002, mesmo com a proibição de receber visitas de parentes, o traficante Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, pôde, de longe, ver e ouvir as pregações de suas irmãs e parentes que pertenciam à Assembléia de Deus dos Últimos Dias. Mais uma vez o pastor serviu de intermediário.
Ele fundou a igreja no início da década de 90. Na época, realizava cultos em sua casa com a presença de apenas 40 pessoas. Hoje, as reuniões na sede em São João de Meriti recebem cerca de dez mil fiéis aos domingos. A igreja tem filiais em Coelho Neto, Duque de Caxias, São Luís (MA) e Maringá (PR). Seu líder se orgulha de manter um centro de recuperação para 150 pessoas, a maioria ex-criminosos convertidos que passam a pregar em boates, presídios, delegacias e favelas. Há 14 anos, o pastor realiza cultos em presídios e delegacias da Baixada Fluminense.
Fonte: O Globo

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