18/10/2004 15h40 – Atualizado em 18/10/2004 15h40
Diário de Cuiabá
Mesmo com o avanço da Medicina, a tradição da benzedeira resiste às mudanças da sociedade e ainda mantém a confiança de inúmeras pessoas em Cuiabá. Usando as mãos, água e plantas, as benzedeiras curam os males do corpo e do espírito. Recorrem a elas pessoas de todas as classes sociais, credos ou religiões. São adultos e crianças com problemas como “mau-olhado”, “arca caída”, “quebranto”, diarréia, entre outros.
Sempre à disposição de quem precisa e sem cobrar nada de quem ajuda, a benzedeira também costuma ensinar remédios caseiros. A casa de dona Maria Valeriana de Souza, 82 anos, no bairro da Lixeira, por muitos anos foi o “pronto-socorro” de muita gente de diversos bairros da capital.
“Dona Vale”, como é chamada pelas crianças, não se lembra ao certo com que idade começou a benzer, mas não esquece quem foi a primeira a pessoa a receber a sua benção. “Era um homem que não andava. Eu não sei bem porque peguei um galho e comecei a benzê-lo. Em seguida ele saiu andando”, lembra.
Entre outros inúmeros casos atendidos, dona Valeriana conta que também foi muito procurada por mulheres grávidas. “Já arrumei a posição de muitas crianças. Teve uma inclusive que nasceu na minha casa”, comenta.
Dizendo que benze contra todos os tipos de males, ela ensina como livrar as crianças com sol na cabeça (dor de cabeça): “coloco um pano na cabeça, assento em cima um copo com água e se borbulhar é porque está com sol na cabeça, aí começo a benzer”.
Hoje, dona Valeriana recebe menos pessoas em sua casa. Mas não deixa de ajudar quem a procura. “O que eu faço é benzer. Eu gosto porque ajudo os outros”, disse relembrando o tempo em quem as pessoas formavam fila em frente a sua casa.
O mesmo acontece em relação à dona Delina Clementina de Jesus, 77 anos, moradora do CPA II. Ela acredita que aprendeu a benzer por meio de um dom espiritual, que todas as pessoas têm, mas que somente algumas conseguem desenvolver ou evoluir.
Dom que passou de mãe para filha. “Minha mãe benzia só ‘quebranto’ e ‘espinhela caída’. Eu por meio da espiritualidade aprendi a benzer muitas coisas”, comenta lembrando que, inclusive, curou um homem picado por uma cobra. “A gente ora o Pai Nosso e Ave Maria e pede a benção para as pessoas. A oração é que liberta as pessoas pela doutrina cristã e de Santo Agostinho de Paris”.
Dona Delina acredita que problemas de saúde que não são curados pela medicina tradicional podem ter origem na espiritualidade. “Já veio aqui uma criança de um médico que tinha cachumba. Não recolheu. Pegou friagem e vento. Já tinham até tirado um pedaço para fazer biópsia. Ensinei um chá para dor e benzi. Melhorou na hora”, garante. “As benções vêm de Deus”.
Em tratamento espiritual, dona Delina comenta que parou de benzer por um período por orientação dos guias espirituais. Mas ela não pretende parar. “Nunca reclamaram que um benzimento não deu certo”.
Quem procura a benção acredita e recomenda. É o caso da auxiliar financeiro Fernanda Souza Pires, 24 anos. Ela conta que a avó também benzia, mas nunca acreditou fielmente nas curas. O que mudou após o nascimento da sua filha Bruna, de 4 anos. Impulsionada pela mãe, Fernanda Pires conta que hoje leva a garota para benzer todos os anos. “A primeira vez, ela (Bruna) estava doentinha e só foi benzer melhorou. Acho que é a fé da gente”.