11/01/2005 15h08 – Atualizado em 11/01/2005 15h08
Folha de São Paulo
O governo federal desapropriou entre janeiro e dezembro de 2004 áreas suficientes para assentar cerca de 25 mil famílias de trabalhadores rurais. A meta era assentar 115 mil, sendo 75 mil delas em terrenos desapropriados para fins de reforma agrária.
Apesar de não ter fechado seu balanço, o Ministério do Desenvolvimento Agrário admite que, assim como ocorrera em 2003, não cumpriu sua meta em 2004. Até 20 de dezembro, 68,3 mil famílias tinham sido assentadas. Em 2004, o governo desapropriou 389 áreas, num total de 875,7 mil hectares, de acordo com decretos da Presidência da República publicados no "Diário Oficial" da União. Em média, segundo o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), cada família assentada fica com um lote de 35 hectares. O processo de desapropriação de uma área leva, em média, de cinco meses a um ano, dependendo do ritmo de cada uma das etapas, como criar o projeto, dividir os lotes e selecionar as famílias. O processo pode atrasar ainda mais, caso o proprietário conteste a desapropriação na Justiça. A terra é paga em TDAs (Títulos da Dívida Agrária), e as benfeitorias, em dinheiro à vista. É provável, portanto, que uma área desapropriada a partir de agosto ou setembro somente se transforme num assentamento no ano seguinte -que é o chamado "estoque" de terra. Entre 1º de agosto e 31 de dezembro de 2004, o governo desapropriou 450 mil hectares (ou seja, 51% do total), contra 143,8 mil no mesmo período de 2003. Em 2004, 49% dos hectares desapropriados estavam na Amazônia Legal (Estados do Norte, além de Maranhão e Mato Grosso), prática condenada pelo PT na condição de oposição devido à falta de infra-estrutura básica (água, luz e esgoto). Nesses nove Estados, a demanda por terra tem sido discreta. Das 316 invasões entre janeiro e novembro de 2004, 17 (5%) ocorreram na região. Além das desapropriações, o governo considera assentadas as famílias colocadas em terras públicas, em projetos estaduais ou em lotes vagos de assentamentos antigos. Há ainda as operações de compra e venda de terras, incluídas, segundo o ministério, na meta de 75 mil famílias. A desapropriação, porém, é apontada como a principal forma de obtenção de terra, segundo o PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária) de novembro de 2003. O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) defende a mesma tese. "A essência da reforma agrária é a capacidade do governo de democratizar o acesso à terra. E, para democratizá-la, só existe um caminho: a desapropriação", afirmou João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST. "Se o governo não priorizar esse instrumento, vai acontecer como na gestão FHC [1995-2002], com o governo realizando desapropriações pontuais sem se preocupar com uma política geral de reforma agrária", completou . Agora, segundo Stedile, o governo Luiz Inácio Lula da Silva "precisa recuperar as diretrizes da proposta do PNRA", com a seleção de regiões prioritárias, como a zona canavieira do Nordeste e da pecuária do Centro-Oeste. Sobre o total desapropriado em 2004, Stedile disse: "O dado demonstra o que estamos avisando o governo há muito tempo. A reforma agrária está a passos de tartaruga, no tamanho e na qualidade. O governo está em dívida conosco no seu acordo firmado em novembro de 2003, que assentaria 400 mil novas famílias [até 2006], priorizando aquelas que sofrem debaixo de lonas pretas". Em 2004, para cumprir a meta, Lula prometeu uma suplementação de R$ 1,7 bilhão ao Desenvolvimento Agrário, mas apenas R$ 700 milhões foram liberados.