Morte de prestador de serviços revelou a ausência de medidas básicas para reduzir risco de acidentes em via pública
O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT24) sustentou, em decisão colegiada, a condenação do município de Chapadão do Sul ao cumprimento de um conjunto de obrigações legais voltadas à proteção da saúde e segurança dos trabalhadores, inclusive a obrigação de constituir e manter em funcionamento a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA+A) e o Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), além do pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 50 mil. O acórdão decorre de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS), após a ocorrência de um acidente fatal envolvendo um prestador de serviços do município em 2018.
A vítima, designada pela Secretaria Municipal de Obras, Transportes e Serviços Públicos para realizar coleta de entulhos e galhos em vias públicas, foi atropelada por uma pá carregadeira operada em marcha à ré. Testemunhas relataram que o condutor do veículo não percebeu o atropelamento, prosseguindo até ser alertado por terceiros. O trabalhador chegou a ser socorrido pelo Corpo de Bombeiros, mas chegou ao hospital municipal sem sinais vitais, com múltiplas fraturas, tendo o óbito confirmado.
Na época, profissionais que laboravam com a vítima relataram ao MPT-MS diversas falhas nas condições de trabalho, que os expunham a risco de acidentes de trânsito em vias públicas.
Tentativas frustradas de acordo extrajudicial
Desde 2018, o MPT-MS vem notificando o município de Chapadão do Sul e apresentando soluções extrajudiciais para adequação do ambiente laboral às normas de saúde e segurança. Apesar de diversas audiências e propostas de Termo de Ajuste de Conduta (TAC), inclusive acolhendo alterações sugeridas pela própria administração, esta não demonstrou interesse em formalizar o acordo.
Além disso, vistorias realizadas pelo setor pericial do MPT-MS, entre 2018 e 2023, nas instalações da Secretaria de Obras e em uma frente de trabalho que realizava a coleta de detritos em vias públicas, identificaram reiteradas falhas como ausência de sinal sonoro de marcha à ré em veículos pesados, falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados ao risco de cada atividade e permissão para que máquinas e equipamentos fossem operados por trabalhadores não habilitados ou não capacitados.
Conforme a procuradora Juliana Beraldo Mafra, que atuou no caso, a tentativa frustrada de resolução extrajudicial da questão, somada à permanência de várias irregularidades referentes ao meio ambiente laboral do município, não deixou alternativa ao MPT senão o ajuizamento da ação civil pública.
Argumentos rejeitados
Em sua defesa, o município de Chapadão do Sul alegou que seus servidores são estatutários e, portanto, não estariam sujeitos à Norma Regulamentadora nº 4, que exige dentre outros pontos a constituição do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT). A administração também argumentou que já possui o Serviço Especializado em Saúde e Segurança do Trabalho e Avaliações Funcionais (SESTAF), com atribuições semelhantes ao SESMT, além de ter implantado outras ações como o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) e o Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT).
Contudo, os desembargadores do TRT24 refutaram as justificativas da defesa, destacando que a existência de uma Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) não renovada e a insuficiência do SESTAF em atender às exigências legais do SESMT invalidam a tese de cumprimento das normas.
Em fevereiro deste ano, a Vara do Trabalho de Chapadão do Sul havia condenado o município em primeira instância por negligência na adoção de práticas de saúde e segurança ocupacional. Na sentença, a juíza Keethlen Fontes Maranhão sublinhou que “ainda que eventualmente se verifique qualquer adequação das irregularidades, tal fato não prejudica a pretensão do Parquet, sendo plenamente cabível a pretensão de tutela inibitória, visando prevenir novas e futuras violações”.
Obrigações impostas
No julgamento, o TRT24 determinou que o município cumpra, no prazo de 90 dias, as seguintes obrigações: elaborar e implementar o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO); constituir e manter em funcionamento a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA+A); constituir e manter em funcionamento o SESMT; assegurar cartão de identificação visível para todos os operadores de veículos oficiais; instalar e manter sinal sonoro de marcha à ré em todas as máquinas e equipamentos; exigir o uso de coletes e vestimentas de alta visibilidade em áreas de movimentação de veículos e cargas, além de garantir sinalização de segurança nos serviços realizados em vias públicas.
A inobservância de qualquer obrigação acarretará o pagamento de multa no valor de R$ 10 mil, cumulativamente, por infração verificada e por trabalhador prejudicado.
Indenização pelos danos à sociedade
Além do cumprimento de diversas obrigações de fazer, o município de Chapadão do Sul também foi condenado ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 50 mil, a ser destinado para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). “A prática do réu gera um ambiente laboral inadequado e inseguro, que fere a dignidade de cada trabalhador posto a seu serviço”, concluiu a decisão que impôs a indenização por dano moral coletivo.