Desde setembro, o Perfil News acompanha a mobilização da comunidade rural, que contesta a forma como o projeto vem sendo executado
O impasse entre produtores rurais e a Arauco Celulose, responsável pelo Projeto Sucuriú, ganhou um novo capítulo nesta segunda-feira (27). Segundo os proprietários de terras atingidos, a empresa teria desistido de comprar e indenizar as áreas afetadas pela construção da ferrovia ligada ao empreendimento, optando agora somente pela desapropriação judicial.
A decisão representa uma reviravolta no processo, já que, até o início de outubro, representantes da Arauco estariam colhendo propostas e avaliando valores para negociar diretamente com os produtores.
“Eles tinham vindo há 15 dias pegando as nossas propostas, fizeram visitas, prometeram negociar a compra. E agora fomos informados que não vão mais adquirir as áreas, apenas desapropriar. Estão usando justamente a frente das propriedades, a melhor parte de cada uma”, relatou um dos produtores durante reunião com vereadores em Inocência.
REUNIÃO COM PRODUTORES, VEREADORES E ADVOGADOS

Cerca de 50 pessoas, entre produtores rurais, vereadores, representantes do município e advogados, participaram do encontro realizado na Câmara Municipal de Inocência. O objetivo foi discutir os desdobramentos da decisão e articular ações conjuntas.
Os participantes relataram falta de diálogo e falta de transparência por parte da empresa, afirmando que nenhum mapa detalhado da ferrovia foi apresentado aos proprietários e que não houve audiência pública para tratar do traçado ou dos impactos da obra.
De acordo com os relatos, a ferrovia será particular da Arauco e o traçado corta as frentes das propriedades, alterando acessos e comprometendo áreas produtivas.
“Não podem chegar aqui e não valorizar nossas raízes e nossa cultura. Não tivemos acesso ao mapa da ferrovia, e onde tínhamos terras na beira da rodovia, passaremos a ter no fundo da ferrovia”, afirmou uma das produtoras durante a reunião.
DIFERENÇA ENTRE VALORES PREOCUPA PRODUTORES

Outro ponto que causou indignação foi o valor das indenizações definidas judicialmente. Segundo os produtores, o preço depositado pela empresa na ação de desapropriação foi de aproximadamente R$ 76 mil por alqueire, enquanto o valor médio de mercado das áreas rurais na região, segundo levantamento dos próprios proprietários, é de R$ 263 mil por alqueire.
Mesmo após audiências de conciliação, as ofertas dobradas pela Arauco ainda estariam bem abaixo do valor real das terras.
“É uma injustiça tirar o pequeno produtor. Uma ferrovia impacta toda a propriedade, causa risco de incêndio, perda de gado e desvalorização. Queremos negociar, mas dentro dos valores justos”, declarou outro participante da reunião.
CONTEXTO: O MEGAPROJETO E AS TENSÕES LOCAIS
Anunciado em 2023, o Projeto Sucuriú é apresentado pela Arauco Celulose como a maior fábrica de celulose do mundo, com investimento estimado em R$ 24 bilhões. A planta industrial será construída em Inocência e contará com um ramal ferroviário para o escoamento da produção.
Para viabilizar a ferrovia, a empresa obteve na Justiça uma liminar que autoriza a desapropriação de cerca de 400 hectares de terras rurais, atingindo aproximadamente 30 famílias. Os produtores alegam que não foram consultados antes da medida judicial e que o processo tem sido conduzido sem diálogo.
Desde setembro, o Perfil News acompanha a mobilização da comunidade rural, que contesta a forma como o projeto vem sendo executado. Agora, com a decisão da empresa de abandonar as negociações diretas e adotar apenas a via da desapropriação, o clima de insatisfação entre os produtores se intensificou.
A reportagem do Perfil News entrou em contato com a assessoria de Comunicação da Arauco que enviou as informações abaixo elencadas:
Construção do Ramal Ferroviário Arauco em Mato Grosso do Sul
27 de outubro de 2025
A Arauco informa que o processo de implantação do ramal ferroviário em Mato Grosso do Sul — que conectará a futura fábrica de celulose em Inocência à ferrovia Malha Norte — está sendo conduzido em total conformidade com os princípios de sustentabilidade e os valores institucionais que orientam todas as suas operações. Um deles é o Bom Cidadão, que reflete o compromisso da empresa em construir relações de respeito, promover uma convivência harmoniosa e gerar valor compartilhado com as comunidades com as quais se relaciona.
O investimento na nova fábrica de celulose no Brasil soma US$ 4,6 bilhões, com início de operação previsto para o final de 2027. O ramal ferroviário, com cerca de 47 quilômetros de extensão, é fundamental para garantir a eficiência e a robustez logística do empreendimento, que já contribui para o desenvolvimento de Inocência com geração de empregos, estímulo à economia regional e melhorias na infraestrutura local.
Desde o início do projeto, a empresa mantém diálogo aberto e transparente com os proprietários das áreas envolvidas. Além das tratativas relacionadas ao traçado da ferrovia, a companhia tem demonstrado disposição para avaliar a negociação integral das propriedades, baseando-se sempre em critérios justos e em valores de mercado superiores aos parâmetros indenizatórios estabelecidos.
A Declaração de Utilidade Pública (DUP), emitida pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), é um instrumento previsto na legislação brasileira que reconhece o interesse público da obra e autoriza a implantação da ferrovia de forma a minimizar impactos ambientais e sociais. No caso do ramal ferroviário da Arauco, esse interesse público se traduz, por exemplo, na retirada de milhares de caminhões pesados das rodovias, promovendo mais segurança viária e a redução de emissões. A concessão de liminares de imissão de posse posteriormente à emissão da DUP é um desdobramento natural em processos dessa natureza, assegurando a continuidade ordenada de projetos com impacto coletivo.
Mesmo após a emissão da DUP — que confere à Arauco o direito legal de prosseguir com a implantação da ferrovia —, a empresa mantém sua postura de diálogo e negociação com os proprietários das áreas envolvidas, reafirmando seu compromisso com práticas justas, respeito mútuo e geração de valor compartilhado.
A empresa reitera seu compromisso com o diálogo e permanece aberta à construção de soluções consensuais com todos os envolvidos.





