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domingo, 4 de maio de 2025

Polícia investiga denúncia de racismo na Uems de Ivinhema

24/09/2004 21h52 – Atualizado em 24/09/2004 21h52

APN

Um professor universitário que ilustrava suas aulas com piadas sobre pessoas obesas, homossexuais e afro-descendentes foi denunciado como racista. Na sala um aluno negro que escuta, do professor, uma frase de cunho racista sobre “um homem que, cansado, após um dia de trabalho, entrava no ônibus e torcia para que quem se sentasse do seu lado fosse uma loira, mas, para seu azar, era um negão que sentaria”. O fato consta no pedido de processo administrativo disciplinar para apuração de falta grave, com pedido de suspensão preventiva do professor Adriano Manoel dos Santos.

A denúncia contra o professor partiu do estudante negro Carlos Lopes dos Santos, que faz Biologia na unidade da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (Uems) em Ivinhema à gerência da instituição naquele município do Sudeste de Mato Grosso do Sul. Beneficiado pelo sistema de reservas de vagas para negros e índios, instituído pela Lei Estadual 2.605, o aluno, teria ouvido, em sala de aula outra declaração racista de Adriano.

Segundo Carlos Lopes, numa explicação sobre roupas pretas, o professor usou a expressão “pretinho básico” relacionada à cor da pele do universitário. O caso foi parar na Polícia Civil, que instaurou inquérito para apurar o caso.

Sete testemunhas ouvidas confirmaram a atitude do professor Adriano. Paralelo à investigação policial, foi pedido à reitoria da Uems abertura de processo administrativo. Especialista em questões raciais, o advogado Hédio Silva Júnior, da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), veio a Mato Grosso do Sul acompanhar o caso e defender o estudante Carlos Lopes. “É uma postura de recusa” às políticas afirmativas, definiu Hédio.

O advogado se reuniu hoje com o vice-governador Egon Krakhecke, que prontamente concordou com o pedido de suspensão preventiva do professor. Nesta sexta-feira, à tarde, numa reunião de representantes do governo e entidades da sociedade civil para discutir o caso, o estudante Carlos Lopes afirmou que seu falecido pai era policial e lembrou um episódio preconceituoso ocorrido em sua infância.

“Quando eu era criança, eu e minha mãe íamos ao mercado e um encarregado do estabelecimento nos perseguia, achando que a gente ia roubar.” O acadêmico recordou que, quando estudava no primeiro grau, hoje ensino fundamental, ouvia o professor dizer que os negros foram trazidos para o Brasil para apanhar e servir e que Zumbi dos Palmares não existia; era um mito.

De acordo com o pedido de instauração de processo administrativo, “ o professor fez a seguinte menção: teria que se nivelar o conhecimento por cima e não por baixo”. Essa posição do professor Adriano Manoel dos Santos vem sendo apontada pelo movimento negro e pela Coordenadoria de Políticas para Promoção da Igualdade Racial como um combate sistemático à política de cotas na Uems. “A cota, não é ela que gera racismo, mas provoca os racistas”, contestou a coordenadora de Políticas para Promoção da Igualdade Racial, Ana Sena.

Em depoimento na Delegacia de Ivinhema, o professor de Física no curso de Biologia, Adriano Manoel dos Santos, alegou “que em nenhum momento teve a intenção de humilhar gordos, negros e gays e não tem qualquer preconceito, principalmente contra negros, até porque tem origem negra”.

Um dos participantes da reunião de hoje, no auditório da Governadoria, o presidente do Instituto Luther King, Aleixo Paraguassu Netto, encorajou Carlos Lopes, dizendo que o estudante está fazendo história na luta contra o racismo e em defesa das políticas afirmativas.

“Dê resposta a esse professor, através de sua performance (desempenho escolar)”, aconselhou Aleixo ao jovem. Carlos Lopes é um dos 267 alunos beneficiados este ano, na Uems, pela política de cotas. O presidente do Conselho Estadual de Desenvolvimento e Defesa dos Direitos do Negro (Cedine), Naércio Ferreira, e o deputado federal João Grandão estiveram na reunião.

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