O Governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB), tem realizado várias reuniões com ministros e com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, com a intenção de retomar as obras da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN3), em Três Lagoas.
Pelo visto, a retomada não está distante. Após o último encontro do governador com Prates que aconteceu nesta quinta-feira (18), ficou decidido que o presidente da Petrobras deve, em breve, visitar a construção. A previsão é que ele venha para Três Lagoas no próximo mês de outubro.
Desde 2014, com as obras paradas, a UFN3 pode ter o término visto ao horizonte. A construção iniciou em 2011, mas foi interrompida em dezembro de 2014, com aproximadamente 80% de conclusão.
Alguns meses após a paralisação da obra da UFN3, os empresários fornecedores estiveram na Câmara de Vereadores de Três Lagoas a fim de conseguirem apoio dos parlamentares

QUEM VAI PAGAR O CALOTE?
Muito tem se falado na possível retomada da UFN3, mas pouco se fala do calote milionário deixado para trás desde 2014. Com a paralisação das obras, empresários ficaram sem receber e estimam mais de R$ 36 milhões em dívidas.
Três Lagoas é uma das potências econômicas de Mato Grosso do Sul. A cidade mudou ‘de cara’ nas últimas décadas com a instalação das indústrias no município. As empresas movimentaram a economia local, atraindo pessoas de todo Brasil e até de outros países a buscarem melhores condições de vida na cidade.
Com a UFN3 não será diferente. A unidade vai ser mais um empreendimento que potencializará a economia de Três Lagoas, mas um fato que aconteceu há alguns anos fez com que os comerciantes locais ficassem com ‘um pé atrás’ na hora de fazer negócios.
Vários protestos foram promovidos pelos fornecedores cobrando responsabilidade da Petrobras

O consórcio UFN 3, até então formado pela empresa Sinopec e Galvão Engenharia, responsável pela construção da fábrica de fertilizantes nitrogenados da Petrobrás, deram um calote milionário nos comerciantes. Alguns seguem sem receber, o que deixou os empresários da cidade mais atentos com futuras negociações.
Fernando Jurado é presidente da Aliança, entidade que une as quatro principais associações de Três Lagoas, sendo a Associação Comercial, Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), Aje (Associação dos Jovens Empresários) e Sindicato Rural.
Jurado conta que se lembra do enorme calote que as empresas tomaram em 2014 pelo consórcio e diz que desta vez os empresários estão atentos.

“Aproximadamente 180 empresas ficaram sem receber pelos serviços prestados. Na época, procuraram a Associação Comercial que começou a realizar uma mediação entre os comerciantes e a Petrobrás. As negociações começaram, mas não foi para frente. Em 2014 a dívida somava aproximadamente R$ 36 milhões. Hoje em dia ela está em processo de correção. Para o comércio evoluir é necessário fazer a economia girar. Somos favoráveis a retomada das obras da UFN3, mas também estaremos mais atentos para que não aconteça o mesmo daqui para frente”
Pessoas investiram pesado com a expectativa de crescer com o desenvolvimento da cidade, mas após o calote, vários empresários ficaram com as ‘mãos atadas’. Segundo denúncias que chegaram ao Perfil News, alguns comerciantes precisaram realizar empréstimos para arcar com as despesas que o consórcio deixou. Desde 2014, unidos, os empresários ainda esperam para receberem o que são deles por direito.

BOLA DE NEVE
Um comerciante que preferiu não se identificar, contou que tinha um empreendimento com vários alojamentos para abrigar os funcionários do consórcio. Ele tinha um contrato de R$ 140 mil por mês. O grupo pagou até o sétimo mês, mas depois a dívida do comerciante virou uma bola de neve.
“Eu tinha uma despesa mensal de R$ 90 mil. Com o fechamento, a minha dívida continuou, mas dinheiro do contrato não entrava. Não tinha como deixar as pessoas ali hospedadas morando na rua. Até hoje ainda não consegui receber e na época, precisei fazer empréstimos para arcar com as dívidas que eles me deixaram”, lamentou.
O advogado Humberto Garcia também foi uma das vítimas. Ele tinha centenas de alojamentos que estavam disponibilizados para o consórcio, mas acabou tomando um calote milionário. Para deixar os comerciantes atualizados, foi criado um grupo em uma rede social com todos os empresários atingidos pelo ‘golpe’.
SEM AS CHAVES
Local onde funcionava a sede da Consórcio UFN3, no centro de Três Lagoas

Outro empresário que preferiu manter a identidade revelada explica que também fornecia imóveis de aluguel para o consórcio. Ele é proprietário inclusive do prédio onde funcionava a sede da unidade. Quando as portas fecharam, nem as chaves do local foram devolvidas.
“Levei um prejuízo milionário. Não devolveram nem as chaves do imóvel, além de destruírem o prédio. Ficamos na esperança de que a gente consiga realizar um acordo com a retomada da construção. Até o momento ninguém nos procurou, mas a gente ainda mantém a esperança”.


Segundo testemunhas, com a esperança de conseguir crescer financeiramente. Pessoas fizeram empréstimos para conseguirem ter um sonho de terem o próprio comércio. Após o calote, muitos empresários não tiveram outra opção e precisaram fechar as portas.
“Vi empresários que tinham cinquenta funcionários e que acabaram quebrando após ficarem ser receber. Muitas pessoas que tinha comércios foram buscar outras alternativas para sobreviver. É muito triste, pois a gente só quer ser pago pelo trabalho realizado. Prestamos um serviço e queremos ser pagos por ele”, destacou.
EQUIPE TÉCNICA
Há alguns meses, o Perfil News, conversou com a equipe técnica da unidade que integrava um consórcio. Conforme os ex-funcionários, quando foi lançada, o contrato inicial era de R$ 3.199 bilhões, porém houve aditivos chegando a R$ 4.250 bilhões. Se for realizar um balanço de quando a obra foi parada (em 2014), o valor para o término do empreendimento seria de aproximadamente R$ 1.450 bilhão.
Os responsáveis pela Galvão foram envolvidos em denúncias de corrupção durante a Operação Lava Jato, e com isso as obras foram paralisadas. A Petrobras absorveu todo o empreendimento desde então.
De acordo com funcionários que trabalharam na unidade, se for levado em consideração o ano de 2014, o tempo para conclusão da obra é de 24 meses, mas lembrando que deverá ser acrescido o tempo para remontagem de equipamentos anteriormente montados e removidos.
Ainda segundo a equipe técnica, pelo fato da obra estar quase toda concluída, equipamentos que vieram até de outros países já estavam na unidade. Os funcionários informaram o Perfil News sobre quais seriam os componentes mais caros que precisaram ser ‘abandonados’ com a paralisação da obra.

PROCESSO DE VENDA
O processo de venda da indústria começou em 2018, com a Araucária Nitrogenados (Ansa), fábrica localizada na Região Metropolitana de Curitiba (PR). A comercialização em conjunto inviabilizou a concretização do negócio.
Em meados de 2019, a gigante russa de fertilizantes, Acron, havia fechado acordo para a compra da empresa. O principal motivo para que o contrato não fosse firmado na época foi a crise boliviana que culminou na queda do ex-presidente Evo Morales.
Já em fevereiro de 2020, a Petrobras lançou uma nova oportunidade de venda da UFN3. Dessa vez, a estatal ofereceu ao mercado a unidade de forma individual. As tratativas só foram retomadas no início deste ano.
Após concluída, a unidade terá capacidade projetada de produção de ureia e amônia de 3.600 toneladas/dia e 2.200 toneladas/dia, respectivamente. Logo, o empreendimento passou a ser estratégico para suprir a demanda por fertilizantes no País e principalmente para trazer desenvolvimento para Mato Grosso do Sul.