10/05/2006 08h48 – Atualizado em 10/05/2006 08h48
Glauber Silveira
A revista Veja publicou na útlima edição (10.05) que as pragas do agronegócio são: ferrugem asiática, aftosa, gripe aviária, mas que a maior delas é a falta de visão dos produtores. Concordo, a sociedade rural foi cega ao acreditar neste País, arriscando tudo, fazendo do Brasil o segundo maior produtor de alimentos do mundo, faltou visão ao esperar a contrapartida que é infra-estrutura, respeito e incentivo para continuar na atividade.A Veja coloca de forma simplista que a crise não existiria se os produtores tivessem feito hedge (fixação do valor do dólar no mercado futuro) protegendo-se da desvalorização cambial. Ora, nem mesmo os maiores economistas do Brasil previam esta baderna cambial do governo Lula, caso contrário, as próprias multinacionais não teriam usado para faturamento um cambio 30% mais valorizado. A matéria coloca o hedge como simples solução do problema cambial, isto prova o total desconhecimento do jornalista com a realidade de nosso país, em particular do setor produtivo. O produtor rural é humilde e, as instituições governamentais de difusão de tecnologia e gestão pouco fizeram, principalmente, na divulgação de como ele poderia utilizar as ferramentas de segurança na gestão do risco do seu negócio. É importante ressaltar que víamos de uma política econômica onde o dólar a cada ano subia. E o câmbio se diz flutuante…Outro fator abordado foi relacionado ao preço dos insumos e do óleo diesel, que impactaram seriamente nos custos de produção. A matéria coloca como solução o uso de tecnologias que racionalizem a aplicação dos insumos. A Veja esqueceu de apresentar estas tecnologias e, sem dúvida, quando o fizer, os produtores ficarão eternamente gratos.O Brasil tem no campo uma das melhores tecnologias do mundo. Tem provado isto com o aumento de produtividade muito superior ao aumento de área plantada. Tecnologia esta, que emprega o plantio direto para a maioria das culturas e, ainda assim, para se produzir cada hectare (ha), na maioria das lavouras, se gasta em torno de 160 litros de óleo diesel em toda a cadeia produtiva.Claro que é possível reduzir este gasto de combustível, mas seria preciso que o governo investisse em infra-estrutura, em estradas melhores. Se tivéssemos ferrovias e hidrovias, como outros países, os custos seriam muito menores, principalmente com o óleo diesel. Dos 160 litros gastos por ha, mais de 100 são em frete de insumos e para levar o produto até o porto.Os agricultores e pecuaristas não vêem como reduzir este gasto, sem investimento em infra-estrutura, apoio à biotecnologia e diminuição de impostos e esperam que a Veja ensine a sua mágica. O óleo diesel do Brasil é o mais caro do mundo, 1 dólar o litro, enquanto nos outros países gira em torno de 0,50 centavos de dólar.A ferrugem, outro grande problema que hoje causa enormes prejuízos, seja pelo aumento de custos ou queda de produtividades e pela dificuldade de seu controle, mesmo em áreas onde não se tem cultura de inverno, foi muito agressiva. Quem dera as respostas viessem antes dos problemas e quando se fala em doença não é tão simples como se coloca.
O produtor tem pagado muito caro para controlar pragas e doenças que afetam a agropecuária. Custos estes que poderiam ser reduzidos se tivessem genéricos realmente compatíveis com preços internacionais. No Brasil, o produtor paga 40% a mais pelos agrotóxicos, isso porque o país é extremamente burocrático com instituições governamentais corruptas e ineficientes.Não se é capitalista privatizando os ganhos e socializando os prejuízos diz a matéria. Correto. Foi acreditando nisto, no regime capitalista do governo brasileiro, que os produtores investiram, mas não pensavam em socializar sua produção e seu patrimônio com os acionistas da Petrobrás, pagando o óleo diesel mais caro do mundo, pagando impostos exorbitantes, os juros mais altos do mundo para especuladores internacionais que não pagam imposto algum ao País.A reportagem colocou os produtores como grandes e imprudentes, pois, investiram no tempo das vacas gordas na compra de terras, máquinas e equipamentos. Nada mais do que justo, é da natureza humana e empresarial querer crescer, acreditando no seu País e na seriedade dos seus governantes. O próprio governo fez isto, comprou terra e assentou, só em Mato Grosso, 48.000 famílias que hoje ocupam uma área de 2,36 milhões de ha, sendo assim, ele também foi imprudente, pois todos os assentados estão endividados. Este governo, sim é anacrônico, pois assenta pessoas e depois as inviabiliza.As manifestações são legítimas, primeiro porque não se está pedindo para o governo pagar a conta e sim para ele fazer seu dever de casa. Como disse muito bem o empresário Antônio Ermírio de Moraes (presidente Cons.Adm. Grupo Votorantim), indústria e tecnologia são degraus do desenvolvimento, mas agricultura e pecuária são as âncoras de tudo. Não se deve matar a galinha dos ovos de ouro.A matéria da revista Veja foi equivocada. Tenho certeza, a classe produtora, em especial os que começaram este movimento O Grito do Ipiranga, no norte de Mato Grosso, nos municípios de Ipiranga do Norte e Itanhangá – onde se encontra o maior assentamento da América Latina, sendo eles da agricultura familiar os primeiros a gritar pela falta de respeito e justiça para com o produtor rural – ainda verão a revista publicar com seriedade a real situação do campo. Certamente a crise chegará até ela, pois ao contrário do que a Veja diz, o agronegócio é responsável por 33% do PIB. Justiça seja feita! *Produtor rural e secretário de Agricultura de Campos de Julio-MT e vice-presidente Oeste da Aprosoja.Apoiado por produtores de outras regiões.