09/05/2006 09h58 – Atualizado em 09/05/2006 09h58
EFE
O Brasil “não é refém” do gás da Bolívia, ressaltou Marco Aurélio Garcia, principal assessor em política internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista publicada hoje pelo jornal argentino “Clarín”.
Garcia reconheceu o mal-estar de Lula por “questões de forma” na decisão do presidente boliviano, Evo Morales, de nacionalizar os hidrocarbonetos do país andino, e se pronunciou a favor da “sensatez” nas negociações bilaterais.
O assessor da Presidência disse que o Brasil buscará outras fontes de energia se considerar excessivo o preço do gás boliviano, e afirmou que a “crise” entre os dois países repercutirá no Gasoduto do Sul, que virá da Venezuela até a Argentina passando pelo território brasileiro.
Neste sentido, Garcia disse que, entre os pontos em estudo para levar adiante a iniciativa, “o mais importante” serão os “aspectos jurídicos e políticos”.
“Digamos que é fundamental o problema da confiança, da credibilidade, em um marco jurídico que garanta que ninguém vai fechar a chave e impedir que o gás circule” pelo Gasoduto do Sul, disse.
Garcia ressaltou que o Brasil precisa do gás boliviano, porque representa a metade do consumo do país, “mas a Bolívia precisa do Brasil” para seu desenvolvimento, por isso há “uma necessidade recíproca”.
“E há uma pressão objetiva para que se chegue a conclusões sensatas”, acrescentou.
O assessor de Lula disse que o Brasil pode optar por “mudar para o gás liquidificado” de petróleo, como fez o Chile, se o preço a ser fixado pela Bolívia “for muito alto”, e insistiu em que espera “que a sensatez predomine” nas negociações.
Garcia ressaltou que “todos” os países da região sabiam o que Morales faria, e que o Brasil “sempre disse que sim” à nacionalização dos hidrocarbonetos bolivianos. Além disso, tinha oferecido grandes investimentos da Petrobras na Bolívia.
“Um ato de soberania sempre é um ato unilateral, mas não foi levado em conta que havia negociações” bilaterais antes do anúncio do presidente boliviano, afirmou.
Segundo o assessor da Presidência, “teria sido mais interessante se Evo Morales tivesse chamado Lula para dizer: ”olha, estamos pensando isso e vamos fazer assim””.
Garcia – para quem houve “uma série de declarações” bolivianas que “não ajudaram” em um entendimento – disse que tinha sido oferecido a Morales a “predisposição de fazer um investimento, só da Petrobras, de US$ 6,5 bilhões em um período curto”, para a construção de um “pólo de gás, mineração e metalúrgico” na Bolívia.
O assessor de Lula negou que o presidente venezuelano, Hugo Chávez, tenha “interferido” neste assunto e que, “de verdade”, acha que a Venezuela “não teria interesse em provocar o Brasil com isso”.
Chávez acompanhou Morales a uma reunião mantida na quinta-feira passada com Lula e o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, na cidade de Puerto Iguazú (nordeste da Argentina), onde foi definida uma solução “racional e eqüitativa” ao fornecimento de gás na região.
Garcia considerou “ridículo” falar de uma briga pela liderança regional entre Lula e Chávez, que anunciou a saída da Venezuela da Comunidade Andina de Nações (CAN) e fez objeções ao processo de integração no Mercosul, de qual seu país está em vias de ser membro pleno.
“Essa discussão é uma discussão ridícula. Na construção do Mercosul, na construção sul-americana, um aspecto decisivo é o eixo Argentina-Brasil. Não é condição suficiente, mas, a meu julgamento, é condição necessária”, disse Garcia.