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quinta-feira, 25 de abril de 2024

Mataboi teria sido “engolido” pelo grupo JBS, acusa pecuarista

07/04/2011 07h25 – Atualizado em 07/04/2011 07h25

A denúncia foi feita pelo pecuarista Cláudio Totó Garcia de Souza, que há 50 anos atua na criação de gado em Três Lagoas

O pecuarista negou que o fechamento do Mataboi do município teria relação com a escassez de animais na região de Três Lagoas

Gilmar Lisboa e Ricardo Ojeda

O fim das atividades do frigorífico Mataboi em Três Lagoas, onde a empresa empregava cerca de 500 trabalhadores, teria sido motivado por uma jogada financeira colocada em prática pelo concorrente JBS, o maior exportador de carne bovina do mundo, que teria interesse em passar a comandar o mercado de carne do gênero na região do Bolsão e, por consequência, ser o principal fornecedor do produto, a partir dessa região, para o Estado de São Paulo, principalmente.

A denúncia foi feita pelo pecuarista Cláudio Totó Garcia de Souza, que há 50 anos atua na criação de gado em Três Lagoas e é um dos principais fornecedores de animais para as empresas frigoríficas da região. O pecuarista foi o entrevistado, na manhã desta terça-feira, do jornalista Ricardo Ojeda na TV Perfil, que vai ao ar pela Web.

O fazendeiro contou que, com o objetivo de “minar” os negócios do grupo Mataboi no município – empresa que atuava ainda em outros três Estados e era responsável, até há pouco tempo, por 23% das exportações da carne bovina brasileira – o JBS atingiu o concorrente no seu lado mais sensível: o financeiro.

Segundo Cláudio Totó, o JBS, que recentemente passou a ser o principal fornecedor de carnes para a rede de lanchonetes MacDonald’s, teria comprado justamente o banco que garantia lastros financeiros para o Mataboi tocar suas atividades no complexo da carne nos quatro estados em que atuava.

Como acionista principal do Banco Matone, a partir do dia 11 do mês passado, o JBS teria cortado os créditos ao Mataboi que antes eram concedidos pela instituição financeira, o que teria afetado as operações desta última empresa e, por consequência, levado ao encerramento das atividades do grupo frigorífico, que somente em Três Lagoas abatia cerca de 15 mil animais ao mês.

“O JBS sempre quis acabar com o Mataboi principalmente na região de Três Lagoas. Com isso, o JBS passaria a ser o principal fornecedor da carne produzida na região do município para o Estado de São Paulo”, disse Cláudio Totó.

O pecuarista lembrou que com duas unidades em Campo Grande e uma na cidade paulista de Andradina, o JBS, com o fim das atividades do Mataboi em Três Lagoas, passaria a ampliar sua participação no setor de industrialização de carne bovina na região do Bolsão. “O JBS na verdade queria ‘engolir’ o Mataboi na região de Três Lagoas e, pelo que parece, conseguiu”, ressaltou o fazendeiro. “O Mataboi incomodava o JBS na região do Bolsão”, emendou Cláudio Totó.

ESTIAGEM NÃO INFLUENCIOU

O pecuarista negou que o fechamento do Mataboi do município teria relação com a escassez de animais na região de Três Lagoas. Ele lembrou, por outro lado, que a longa estiagem de 2010 teria comprometido os rebanhos da região, mas, nem por isso, o fato seria motivo para o fim das atividades da unidade frigorífica no município.

“Passamos por uma longa estiagem no ano passado, o que fez inclusive muitos pecuaristas a perderem rebanhos. Em seguida, nos primeiros meses deste ano, convivemos com um longo período de chuvas. Mas de maneira alguma esses dois fatores levaram os fazendeiros a reter gado no campo e, por consequência, a reduzir as remessas ao Mataboi de modo a influenciar na operacionalidade dessa empresa”, contou o fazendeiro.

MONOPÓLIO DA CARNE

Cláudio Totó lembrou que a atuação quase que isolada do JBS na região de Três Lagoas, a partir do fechamento do Mataboi, poderá fazer com que o grupo frigorífico consolide na região uma política de monopólio do setor da carne, onde a empresa poderia se sentir à vontade para fixar o preço do produto dentro de suas conveniências. O pecuarista avaliou que a consolidação de um monopólio da carne pelo JBS na região do município poderia vir a “quebrar” muitos fazendeiros.

“O cartel da carne já é evidente na região e a expectativa é de que agora se instale por aqui um monopólio, que seria uma medida ainda mais prejudicial aos fazendeiros a ao próprio consumidor”, falou Cláudio Totó.

O pecuarista lembrou que o JBS, que possui unidades frigoríficas praticamente em todos os continentes, desfruta de um grande crédito junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e, por isso, tem tido lastro financeiro para ampliar suas áreas de atuação, em detrimento de empresas do setor com menor capacidade de investimentos.

NOVAS POLÍTICAS

Cláudio Totó defendeu que sejam criadas novas políticas oficiais para proteger os pecuaristas de alterações climáticas e até de eventuais problemas financeiros que as indústrias da carne venham a ter e que atingiriam, de forma direta, o bolso dos fazendeiros. “Não podemos mais ficar presos a coisas do passado, a vícios antigos. Queremos que o governo crie mecanismos que deem garantia de preços aos pecuaristas e que, com isso, possam também vir a servir de escudos para proteger o setor de maus empresários”, salientou o pecuarista.

Ele denunciou supostas “jogadas jurídicas” feitas por donos de frigoríficos ao longo dos últimos 50 anos na região de Três Lagoas e que teriam levado à concordata pelo menos 20 empresas do gênero da região.

“Muitos frigoríficos, ao longo dos últimos 50 anos, têm contado com a conivência e certa benevolência da Justiça e, com isso, entram em regime de recuperação judicial, que é a antiga concordata. Dessa forma, essas empresas ganham um prazo de carência para se recuperar e, nesse meio tempo, ampliam seus capitais que, posteriormente, em muitos casos, usam para investir em novos negócios”, explicou Cláudio Totó.

O pecuarista sinalizou que, no caso do Mataboi, as dívidas que a empresa deixou na região, de cerca de R$ 1,4 milhão junto a principalmente fazendeiros, deverão ser prorrogadas ainda por um bom tempo, a exemplo do que aconteceu com outras unidades frigoríficas que fecharam na região do município, ao longo dos últimos anos.

Cláudio Totó disse que os frigoríficos têm atuado, nos últimos anos, para tirar o máximo de vantagem dos pecuaristas, degradando a atividade. Ele falou que, se pudessem, os donos de frigoríficos acabariam com as fazendas. “Eles só não fazem isso porque não teriam de onde tirar a sua matéria-prima”.

ÊXODO DA PECUÁRIA

O pecuarista prevê que até o fim desta década, ou no máximo até a próxima, um reduzido número de pecuaristas vai estar atuando na região do Bolsão. Ele afirmou que a chegada das empresas de celulose, com a consequente troca da pecuária pelo plantio de eucaliptos na região vai acabar por quase extinguir a criação de gado em Três Lagoas e nos municípios num raio de até 500 km desta cidade.

CONSÓRCIO SILVIPASTORIL: “Isso não passa de pano de fundo para essas empresas apressarem o fim da pecuária na região”

Ele disse que nos dias atuais muitos pecuaristas, afetados pelas mais diferentes crises que têm atingido o setor, já vêm trocando a pecuária pela cedência ou até a venda de terras para o plantio de eucaliptos na região. “Muitos fazendeiros que já não vislumbram lucros no setor da pecuária da região estão vendendo ou arrendando às terras às empresas de celulose”, disse Cláudio Totó.

Ele avaliou que haverá um êxodo de fazendeiros da região do Bolsão nos próximos anos, em função da chegada das empresas de celulose. O pecuarista revelou que o custo da produção nas fazendas da região cresceu cerca de 50% nos últimos cinco anos, período em que também o preço da arroba do boi se estabilizou nas cidades do Bolsão.

PROJETO INVIÁVEL

Cláudio Totó chamou de ficção projeto defendido pelas indústrias da celulose e que prevê que se implante n
a região do Bolsão o consórcio silvipastoril, que permitiria o manejo de gado em meio às plantações de eucalipto, que servem de matéria-prima para a produção de papel na região. “Isso não passa de pano de fundo para essas empresas apressarem o fim da pecuária na região”, afirmou Cláudio Totó.

Cláudio Totó falou ao jornalista Ricardo Ojeda no quadro de entrevista da TV Perfil (Fotos: Gilmar Lisboa)

Atuando no mercado da pecuária há mais de 50, Cláudio Totó fala com conhecimento de causa os problemas que a classe vem enfrentando nos últimos anos (Fotos: Gilmar Lisboa)

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