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domingo, 2 de junho de 2024

Quênia é a nova face visível da tragédia africana

03/01/2008 10h48 – Atualizado em 03/01/2008 10h48

IG

Para turistas ocidentais, o Quênia era até o finalzinho de 2007 um paraíso de safari e surfe. Agora estão aí as cenas de mais um pesadelo africano, marcadas pela escalada de conflitos e massacres tribais. Já são centenas de mortos e as imagens dantescas da carnificina em uma igreja na cidade de Eldoret reavivam a memória sobre o que aconteceu em Ruanda em 1994. Como o mundo tristemente aprendeu nos anos 90 quem eram os hutus e tutsis em Ruanda, talvez seja melhor ir praticando quem são os os kikuyus do presidente Mwai Kibaki, reeleito no Quênia graças à fraude no domingo passado, e os luos do líder oposicionista Raila Odinga, A fraude foi o estopim para a escalada de violência em meio ao ressentimento dos luos e outros grupos em relação aos kikuyus, a maior tribo e com papel dominante na política e economia. Portanto, é enganosa a idéia de que o Quênia simplesmente tenha despencado para o caos, estragando uma narrativa de um país relativamente estável, pacífico e próspero para os padrões africanos. Agora temos uma mobilização internacional para impedir a degringolada queniana, mas países ocidentais fracassaram para responder à escalada da crise. A rigor, como admitiu o próprio jornal “Financial Times”, houve cumplicidade de governos e de organismos como o FMI e Banco Mundial. Choveram apoio e dinheiro para o governo de Kibaki, visto como a face aceitável da África. Mas a promessa de reformas com a vitória eleitoral em 2002 se evaporou e foi a mesmice de corrupção endêmica e fidelidades étnicas. Outro ponto importante: Kibaki se tornou na África um aliado crucial do governo Bush na guerra contra o terror. O Quênia, de fato, estava prosperando (crescimento de 6% ao ano), mas os frutos não eram divididos. Apesar de toda a ajuda internacional, 55% dos quenianos vivem abaixo do nível de pobreza. Eram 48% em 1990. Kibaki também recebeu uma ajuda substancial dos americanos nos esforços antiterroristas Vale lembrar que em 1998 a embaixada dos EUA em Nairóbi foi alvo de um medonho atentado da rede Al Qaeda, assim como a missão diplomática na Tanzânia. O líder oposicionista Odinga, no seu esforço para se distanciar da política oficial e cativar a significativa população muçulmana do Quênia, se mostrou menos receptivo aos interesses americanos durante a campanha eleitoral. Carismático e populista, ele também soube canalizar a insatisfação de amplos setores populares, em termos étnicos e econômicos. Sintomaticamente, Washington se apressou em dar os parabéns ao presidente Kibaki por sua farsa eleitoral, para então voltar atrás. Como em tantas partes do mundo (e nenhum lugar é tão escandaloso como o Paquistão), o Quênia está pagando um preço sangrento pela tolerância do seu governo corrupto por parceiros ocidentais .

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