09/02/2006 09h45 – Atualizado em 09/02/2006 09h45
Folha da Região
Internautas utilizam o espaço virtual para divulgar condutas consideradas apologia ao crime. “Eu tiro racha em Araçatuba/SP” e “Rachas e Pegas Araçatuba/SP” são comunidades virtuais criadas dentro do Orkut, para reunir e proporcionar um ponto de encontro entre pessoas que praticam as disputas em alta velocidade, crime identificado no Código de Trânsito Brasileiro classificado inclusive como doloso, com a intenção do autor. Os rachas, que têm mobilizado a polícia e autoridades locais, são temas das duas comunidades que juntas contam com 73 membros. Trata-se de duas áreas virtuais que servem para os “praticantes de rachas” comentarem a respeito de “eventos do tipo” promovidos na cidade. A comunidade mais antiga, “Eu tiro racha em Araçatuba/SP” foi criada em 12 de junho do ano passado e conta contava com 51 participantes até a tarde de ontem. São pessoas que adicionam a comunidade entre as suas favoritas. A reportagem buscou falar com o criador da comunidade, Vinícius Antônio Bigatão, mas ele não quis comentar o assunto, disse, no entanto que não previu o fato de a comunidade ser considerada de apologia ao crime. A segunda página registra do Orkut do mesmo assunto é a “Rachas e Pegas Araçatuba/SP” foi coloca no ar no dia 28 de janeiro deste ano, e já tem 22 membros. No recado de abertura da comunidade, o criador expressa o seu ponto de vista: “Criada para todos akeles que tiram rachas e pegas de carro e moto em Araçatuba/SP e região ou para akeles q gostam de ver ou apreciam os famosos rachas q fazemos na famosa SP-300. Entrem todos, façam fóruns e quero vê akeles q acham q tem pressão lá na Rondon”. O dono da comunidade, denominado Jefferson M. Lucas, não foi encontrado pela reportagem.LEI –Incitar, publicamente, a prática de crime, ou fazer, publicamente apologia de fato criminoso ou de autor de crime são infrações previstas do Código Penal, na parte dos Crimes contra a Paz Pública. “Sendo o racha um crime previsto em lei, a sua apologia também é crime”, diz o delegado de polícia e professor de Direito, Vilson Disposti. De acordo com ele, identificada a incitação ao crime, a pessoa pode pegar de três a seis meses de detenção, ou multa. Ontem, o delegado disse que iria avaliar a conduta dos membros das comunidades dentro da rede de computadores. Para ele, muitas pessoas ainda não têm consciência das conseqüências que a ação promovida dentro da internet pode lhe ocasionar. Ele lembra que, antes do advento da internet, era considerada incitação ao crime, andar na rua com uma camiseta com o desenho de uma folha de maconha, por exemplo. “Agora, a internet tem proporcionado o desenvolvimento de apologias ao crime em grande escala”, diz. Disposti, que tem acompanhado casos de crimes virtuais cometidos em Araçatuba, diz que a maior dificuldade é a falta de legislação específica para crime envolvendo a internet e de equipamentos de informática para a Polícia. “Uma investigação dessa precisa de máquinas ligadas em rede, como as que devem implantadas num programa que o governo está promovendo atualmente”. O 1º Distrito Policial, onde o delegado é titular, só foi informatizado no ano passado.Para o professor de informática jurídica Leandro Bottazzo os internautas precisam ter em mente que a conduta virtual tem que estar dentro dos limites do “mundo real”. “Invariavelmente, em alguma época, essa ação terá reflexo sobre a vida real”, diz. Ele lembra, inclusive, da nova tendência das empresas de Relações Humanas que investigam a vida “social digital” de pretendentes a determinadas vagas. “Vasculham em que sites têm acesso, que tipo de assunto está vinculado ao seu nome”, diz.Ele alerta os internautas a terem conhecimento da ação promovida na rede de computadores. Em relação ao crime de racha, o Código de Trânsito Brasileiro (lei nº 9.503/97) prevê a punição da prática no artigo 308. A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Ocorrendo lesões corporais ou morte em decorrência do racha, a tendência dos Tribunais é considerar a prática como crime doloso (com intenção) uma vez que, quem faz tal prática, assume o risco deliberadamente de produzir resultados danosos a terceiros.No caso de lesão corporal, a pena varia de acordo com a gravidade da lesão, de três meses de detenção até oito anos de reclusão (artigo 129 do Código Penal). Ocorrendo a morte, a pena varia de seis a 20 anos de reclusão (art. 121 do Código Penal).FRASESNos fóruns promovidos dentro das comunidades, os integrantes também comentam sobre as disputas já realizadas, o tipo de carro que vem sendo utilizado para o evento, e em um dos casos, sobre a possibilidade da construção de uma pista de arrancada na cidade. Um grupo de incentivadores de competições de arrancada, considerada modalidade automobilística, desenvolveu um projeto para a construção de uma pista para a realização de eventos desse tipo na cidade, mas a campanha para a concretização do projeto não foi levada a diante. Enquanto isso, nas entrelinhas dos recados deixados nas comunidades, os praticantes deixam parecer que as disputas de velocidade continuam sendo realizadas em Araçatuba. Comentam inclusive dos rachas realizados na rodovia Marechal Cândido Rondon (SP-300), conforme publicado na Folha da Região do último sábado. Entre as frases que se destacam nos recados deixados nas comunidades estão comentários que instigam a disputa. “Onde há racha, há atrito” e “Onde tem racha tem rivalidade”, comenta um dos praticantes e membro de uma das comunidades. Tem internauta orkuteiro que tenta conscientizar “Racha não, arrancada”, escreveu um deles em uma das comunidades. E tem aquele que garante que “Por mim tiro racha todos os dias”. O orkut é um sistema afiliado a um site de buscas, criado em 22 de Janeiro de 2004, que serve para relacionamentos sociais, com milhões de pessoas cadastradas e conectadas. Nesse espaço virtual, as pessoas costumam manter contato com amigos e participar de comunidades que tratam de temas específicos.