13/12/2004 11h02 – Atualizado em 13/12/2004 11h02
Dourados News
O professor de física da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) Adriano Manoel dos Santos, 31 anos, virou réu na Justiça do Estado acusado de ser racista com o estudante de biologia Carlos Lopes dos Santos, 35 anos, que entrou neste ano na instituição, na cota para negros.
Lopes afirma que o professor contava piadas sobre negros na sala de aula. De acordo com o relato dele, no dia 23 de junho passado, Santos teria dito: “Tratava-se de um homem que, cansado após um dia de trabalho, entrava no ônibus e torcia para que quem sentasse ao seu lado fosse uma loira, mas para seu azar era um negão que se sentaria”.
Lopes registrou queixa contra Santos na Polícia Civil. O inquérito foi enviado ao Ministério Público, que denunciou o professor com base na lei 7.716/89, a qual define crimes de “preconceito de raça ou de cor”. O artigo 20 da lei em que Santos pode ser enquadrado prevê pena de um a três anos de prisão mais multa.
No dia 12 de novembro passado, o juiz César Castilho Marques, de Ivinhema, aceitou a denúncia. O estudante disse que o professor também usava expressões como “um sujeito com muita melanina [proteína de cor preta encontrada na pele]” e “pretinho básico”, além de afirmar que uma universidade deve “nivelar por cima, e não por baixo” –no que seria uma referência à entrada de negros na universidade.
No fim de novembro, houve novo desentendimento entre os dois. Santos disse que chamou a PM porque Lopes estava atrapalhando a aula e ofendendo sua mulher. O caso virou processo no Juizado Especial. Lopes prefere não comentar o assunto.
O advogado Hédio Silva Jr., especialista em legislação de combate ao racismo no país e que atua como assistente de acusação na ação contra o professor, disse que esse é o primeiro caso explícito no Brasil envolvendo estudantes beneficiados pelo sistema de cotas.
Segundo Silva Jr., as cotas tendem a tornar “explícito” o racismo porque obrigam o contato entre negros e brancos. “A cota não gera racismo, somente aflora o que tem dentro da pessoa. Enquanto o negro estiver correndo da polícia, no boteco bebendo pinga ou fazendo batuque, ele está no lugar onde as pessoas querem que ele fique”, diz Lopes.
Na sexta-feira, Santos negou que seja racista ou tenha contado piadas do gênero. “O que me deixa angustiado é que, nas minhas raízes, o meu avô era negro e minha avó, por parte de pai, era índia”, afirmou Santos. “Eu nunca tive nada contra as cotas. Sou a favor de tudo o que diminua as diferenças sociais”, disse.
“Brincava [na sala de aula], mas nunca mencionei nada de conteúdo racista”, acrescentou. Segundo ele, uma sindicância aberta pela Uems para apurar o caso foi arquivada e julgada improcedente. De acordo com Santos, cinco alunos, sorteados para prestar depoimento na polícia, negaram que ele seja racista.
“Nós já esperávamos que surgissem processos na questão de racismo. A entrada de negros e índios na universidade fez com que essa coisa aflorasse”, afirmou a pró-reitora de ensino da Uems, Maria José Jesus Alves Cordeiro, sobre a acusação feita pelo estudante. A pró-reitora disse que o assunto está na Justiça e, portanto, diz ela, fora da universidade.
A Uems possui 7.000 estudantes em 15 unidades no Estado. Para negros, a universidade reserva 20% de suas vagas em cada vestibular. A instituição ainda guarda 10% (168 vagas) para índios.