13/04/2006 16h02 – Atualizado em 13/04/2006 16h02
Midiamax News
“Não sei entender isto não, não consigo. O caso era grave, não tinha que levar para outro lugar e jogar no corredor”, disse Ednéa Aparecida dos Santos, que ainda questiona a morte da filha, a adolescente Tamara Santos Toledo Santana, de 15 anos, que faleceu na madrugada do dia 13 de março, cerca de 15 horas depois que foi retirada do isolamento da Santa Casa de Campo Grande para dar lugar a duas pessoas que chegaram do Japão com suspeita de estar com gripe aviária.Em fevereiro deste ano, a jovem teve diagnóstico positivo para LES (Lupus Eritematoso Sistêmico), uma doença que afeta o sistema imunológico. Internada em crise na Santa Casa, foi levada para o isolamento, mas transferida para dar lugar a duas pessoas que vieram do Japão, com suspeita de gripe aviária, o que, mais tarde, foi constatado que elas tinham apenas rotavírus. Uma pessoa que tem lupus desenvolve anticorpos que reagem contra as células normais, podendo, conseqüentemente, afetar a pele, as articulações, rins e outros órgãos, ou seja, a pessoa se torna “alérgica” a ela mesma, o que caracteriza o mal como uma doença auto-imune.Ednéa não questiona a necessidade de se isolar as duas pessoas que vieram do Japão – mãe e filha – com suspeita de gripe aviária, mas, sim o procedimento de se retirar Tamara do isolamento e, em seguida, levá-la para o corredor do hospital. “A gente usava luvas e máscara para falar com ela, disseram que estava com imunidade baixa, como então colocar no corredor?”, questiona.DramaO drama de Tamara começou muito antes do internamento na Santa Casa, mais precisamente em setembro do ano passado, quando a médica Érika Naomi, do CEM (Centro de Especialidades Médicas), diagnosticou artrite reumatóide juvenil, por conta do inchaço nas juntas (mãos, pés e joelhos) que a menina apresentava. “Não havia outros sintomas que indicassem lupus, não havia como saber”, diz Ednea, explicando que foram receitadas doses de predinizona e diclofenato.Em dezembro, os medicamentos deixaram de surtir efeito e a prescrição de Predinizona foi elevada de 5 mmg para 20 mmg, sendo que, em janeiro deste ano, a médica pediu novos exames para verificar se a medicação deveria ser alterada. No mês de fevereiro, as dores nas juntas aumentaram e, no dia 24 de fevereiro, Tamara começou a sentir fortes dores no pescoço e achou que fosse muscular.Ednéa lembra que a menina tomou uma dose extra de predinizona, mas que a dor não cedeu durante todo o fim de semana. Na segunda-feira, por volta das 20 horas, Tamara foi levada para o posto de saúde do bairro Guanandy, sendo liberada às 22h30, já que não havia clínico no posto. Na madrugada de terça-feira, 28 de fevereiro, a adolescente foi internada na Santa Casa com muita febre. “Ela chegava a tremer de tanta febre”, lembra Ednea.A garota ficou no corredor do hospital até quinta-feira, 2 de março, quando, segundo a mãe de Tamara, uma residente identificada apenas como Patrícia foi a primeira pessoa a desconfiar que a adolescente estivesse com lupus. O reumatologia Marcelo Cruz Rezende suspeitou de pneumonia e derrame pleural, argumentando que a menina já tinha acompanhamento de outra reumatologista e, por isso, deu alta para que a colega pudesse avaliar o quadro clínico da menina.Na quinta-feira, a febre não havia cedido e, no dia seguinte, 3 de março, a reumatologista Érica Naomi pediu 15 tipos de exames para verificar se a menina estava com lupus. “A gente foi para casa, mas à noite a Tamara voltou a passar muito mal, não conseguia nem ficar sentada, estava com muita falta de ar”, recorda a mãe, explicando a adolescente voltou a ser internada na Santa Casa e, de novo, no corredor.Ednéa lembra que alguns exames solicitados teriam de ser feitos em São Paulo (SP) e, por isso, houve a demora em se fechar com certeza o quadro clínico da menina. Ela disse que no dia 8 ou 9 de março Tamara foi levada para o isolamento do hospital, uma ala dividida em dois quartos. “Os médicos deram uma máscara para a minha filha e, qualquer pessoa que chegasse perto, ela já colocava no rosto, pois estava assustada”, recorda-se.Uma semana depois, Ednéa estava no trabalho, quando recebeu uma ligação da outra filha, Eniele Santos Toledo Santana. “Ela me ligou chorando, dizendo que a Tamara foi retirada do isolamento”, disse Ednéa, completando que a irmã de Tamara perguntou aos enfermeiros a necessidade de se retirá-la do quarto. “Um enfermeiro me falou que era por causa da suspeita de gripe aviária, que duas pessoas que vieram do Japão seriam internadas lá”, lembrou.Foi neste dia que Ednéa começou a questionar o procedimento tomado no hospital. “Ela ficou pouco tempo no corredor, mas depois foi levada para um quarto com outras três mulheres. Eles falavam que ela estava com imunidade baixa, ela não poderia ficar perto das outras”, recorda-se a mãe, que chegou a perguntar ao reumatologista Marcelo Rezende se isso seria aconselhável. “O médico disse que os residentes iriam providenciar outro lugar para ela e que seria melhor ficar no quarto do que perto dos que estavam com suspeita de gripe aviária”, informou.A menina ficou no quarto com outras três mulheres durante 15 horas e foi levada para o isolamento após ser diagnosticado que as duas pessoas que vieram do Japão estavam com rotavírus. “Só que ela já tinha piorado, até a gente teve que usar luvas e máscaras. Eles colocaram um aviso na porta do quarto dela, deixaram minha filha assustada”, contou Ednéa, lembrando ainda que um dos enfermeiros disse que Tamara tinha contraído uma infecção hospitalar, provavelmente pelo uso do banheiro com outros pacientes.A partir daí, Tamara não apresentou melhora no quadro e Eniele lembra que a irmã foi submetida a uma drenagem, o que não teria sido do conhecimento do médico responsável. A adolescente morreu na madrugada de segunda-feira, dia 13 de março, às 5h15. “O médico ainda perguntou se eu queria que fizessem autópsia, mas eu não queria nada”, conta emocionada, revelando que no atestado de óbito consta que Tamara morreu de vascurite pulmonar, derrame pleural, anemia hepática e lupus eritematoso sistêmico. “A infecção hospitalar não foi citada no atestado”, disse Eniele Santos, lembrando que também não foi citada no prontuário.A reportagem do Midiamax entrou em contato com a Santa Casa desde que tomou conhecimento do caso, mas, até o fechamento da matéria, a direção do hospital não se pronunciou. De acordo com a assessoria de imprensa do estabelecimento de saúde, seria viabilizada uma entrevista para que o caso fosse discutido. O médico Marcelo Rezende disse que somente se pronunciaria caso fosse autorizado pela diretoria do hospital.